Meu pai, você não deve continuar assim. Tenho dito entre as portas batidas na hora do nervosismo, não deve permanecer assim. Esse copo não lhe faz bem meu pai. E faço mal à sua solidão. Me senti inútil quando vi nos seus olhos, aquela coisa que eu chamo tristeza. Aquele olhar fundo, me procurando pequena. Que falta me fez voltar no tempo. Poder consertar um bocado de coisa que me contaram, e que também vi. Eu sei quem é você meu pai. E, sinceramente, parece até com meus irmãos. Jeito meio bobo de pensar tantas vezes. Deslumbrar com essas coisas que o mundo inventa, que dizem trazer vida boa. Vida boa pra mim, estava na sua pasta de música, naquele seu violão velho no quintal com minha mãe cantando. A gente nem tinha muita coisa. Mas nem tanta coisa era preciso. Tinha lá seus copos e garrafas espalhadas pela casa. No final, minha barriga doía de tanto comer. Tudo bem porque eu sei que não dava tanto valor. Mas sei o quanto era feliz. E quer saber? Eu me sentia bem, mesmo só ouvindo. Mesmo só correndo pela casa, coisa que eu amava fazer. Mesmo que por um bom tempo, me senti só. Faz mal não pai. A gente se sente só, mas aprende muita coisa. Você disse isso quando eu fui embora tentar estudar. Eu aprendi coisa demais mesmo. Mas voltando a você, eu só queria que parasse um pouco. Pensasse um pouco. Onde é que vai chegar assim? Faz tempo que não busco remédio pra você. Deve fazer tempo que nem toma remédio. E o copo, na mão. É meu pai, eu tinha que conseguir falar... Mas enquanto não consigo, eu rezo e peço a Deus, que te mostre aquela vida melhor e te faça guiar nesse caminho.
Eu falo como se fosse a primeira vez. Sinto medo como se tivesse ainda quinze anos. E já que falar tudo que eu queria não tá adiantando muito, não vai mudar... eu peço que faça qualquer coisa, pra eu não ver mais beleza em qualquer lugar ou coisa que tenha você. Grata.
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