Eu sempre acho que estou exigindo demais dos outros. Do mundo. O que deveria exigir mais de mim. Sempre, sempre. Odeio dar trabalho, prefiro ficar no prejuízo, pra ver que seja um sorriso ao invés de lágrima ou rancor. Mas depois de aprender e mudar tanto, pra mim ás vezes é ruim, dói ver a verdade. Porque me ensinaram tanto a lutar por minhas escolhas e pelos meus direitos, que deleti parte desse jeito de ser. Diziam: você pode sim. E sim. E sim...

Fui com medo, sabendo dos olhares diferentes que surgiriam. Das pessoas que eu deveria conhecer porque me conhecem a fundo, sem eu mesma saber. Cheguei até a me culpar por ser tão distraída com isso. Ao descer do carro, ela fez um bico enorme e olhou para o pai: por que não me disseram que as namoradas viriam com blusa? - Eu supliquei que se calasse, o que acontecia era um privilégio pra mim. Feito. Entrei na igreja e me sentei bem longe de todos que conhecia, e a mulher que estava ao meu lado, conversava comigo falando meu nome. Bem, eu mesma, nem a conheço. Mas foi bem vinda, muito bem vinda. Aquele lugar fazia eu me sentir mal. Se eu estivesse sozinha lá dentro, não. Mas sob tantos olhares surpresos por minha presença eu me senti. Conseguia até ver alguém me jogando um papel na cabeça e me mandando sair. E eu sairia, de verdade. Como se não bastasse, ela me mandou chamar lá na porta, onde toda a família se concentrava para entrar. Cheguei e me assustei: você vai entrar comigo. - Olhei todas as noras, cunhadas e disse que não. A missa não era dela, e era um privilégio eu me sentar ali. Voltei com vergonha, me sentindo só e querendo chorar. Mas não o fiz. Voltei pro lugar e assisti a família inteira entrando, com as blusas decoradas, felizes. Parecia bem completa. Entendi que nunca poderia dar a ela algo assim. Cerimônias, grandes comemorações tradicionais. Bebês passavam nos colos e seus olhos brilhavam felicidade. E se eu fosse um garoto, podia até ser feio, pobre, analfabeto, surdo, mudo, órfão, mas se eu fosse um garoto nada daquilo me afetaria. Não, eu não quero ser um garoto, imagina! Amo ser garota e nem me imagino ser outra pessoa. Foi só uma observação. Com sentido, óbvio. Vi a missa, sem saber responder à quase nada daquelas falas repetidas. E ás vezes me emocionava pensar num casamento tão longo. Me emocionava ver pessoas tão bem reconhecidas pela sociedade. Mesmo que soasse bem falsa certas recepções. Família é uma coisa complicada, eu pensava sozinha. No fim, consegui cumprimentar somente um deles. A aglomeração era demais e minha altura despertava atenção, além do fato de eu estar ali, lógico. Ela queria me acalmar, pediu desculpas e dei toda a razão à ela. Sei como é, querer incluir quem se ama numa família. Sei o quanto importa para ela. Mas é um dos preços a pagar. E, bem, eu pago, sem problema algum. Os que eu conhecia de verdade ali, me trataram muito bem. O pai, a mãe, a irmã. Outra família pra mim. Mais um motivo pra chorar, lá fora. A preocupação de cada um, inclusive a minha, por ser tudo tão exigente me emocionou. Se preocuparam comigo!
Saí da igreja com uma pequena melancolia, vontade de conversar. Sem entender direito esse mundo estranho em que nasci. Não consigo me culpar mais, pelo que sou. Somente quem nasce como nasci, pode dizer o que sinto. Não posso e nem vou ficar reclusa. Já passei dessa fase. Sei tão bem o que sou e o que quero, mas as vezes esse abismo que se abriu na minha vida, me deixa fraca por pensar. São as mesmas pessoas que me olham torto, me desafiam com cumprimentos, que me elogiavam e me pegavam no colo em dias de natal pela rua. E eu? Eu sou a mesma também.

Comentários

Anônimo disse…
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