Por um passado que me faz perceber que tudo melhora, busquei abrir a janela, mesmo que chovesse dentro de casa, lembrando das coisas que durante tanto tempo fingi que não vivi. E questiono o porquê de sentir tanta falta de ser criança, se hoje o que me arrebata é ter a verdade nas mãos e conseguir entender mais da metade do que eu perguntava, olhando pra cima a cara de bravo de pai e de mãe. Segurava no bolso de trás, que era muitas vezes o que me restava e tentava andar no mesmo ritmo que ela, chegava a fechar os olhos pra conseguir correr mais rápido. Podia ver a novela que eu quisesse se fizesse companhia, esperando pai chegar de madrugada, via sexo, morte e ás vezes esses tapas técnicos de novela. Mas tive que encontrar uma revista velha pra perguntar um tanto atrasada, por que é que a gente sangra todo mês. Podia beijar os meninos, se quisesse esconder e escolher. Mas não queria. Não queria meninos, não queria scarpin, não queria que o Elias fosse embora, não queria dormir sozinha, não queria morar mais naquela cidade, não queria carnaval. E eu sempre soube do que não gostava, era mais madura, talvez, do que hoje. Não era a infância, era eu. Me quero de volta. Nem que seja um tantinho.
Voltou aquele sorriso tímido que eu media milimetricamente de longe, para considerar que era sim um momento de felicidade. Voltou o 'bom dia' mais legal, as perguntas sobre a vida e a 'boa noite' pedindo o abraço que eu ainda não sei dar. Voltou sem seu violão melodramático, no quintal solitário, porque voltou contente. Voltou sem julgar nada, ninguém, nem mesmo ele. Voltou meio ciumento, mas hoje olha pra mim e vê, porque sabe que há espaço pra ele também. Voltou pra mim e marcou seu território, aqui dentro e pelo mundo, daqueles que, apesar de tudo, eu ainda admiro. Meu pai voltou.
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