Eu jurava que não, que alguma coisa sempre iria tapar esse buraco estranho que eu vi crescer, não iria doer assim. Foi costume em cima de costume, deixando passar e em momento algum pedi socorro. Uma casa com tanta fartura, uma vida cheia de planos como a minha sempre foi, dispensa algumas coisinhas bobas, dispensava cada vez mais, quando meu pai chegava em casa contando sobre mais alguma empresa, mais trabalho, mais prosperidade, vocês vão estudar, engenharia, pode escolher, serão sucesso, quero ver ganhando bem, pense grande menina, como seus irmãos. E assim, cresci. Não como eles queriam, provavelmente. Mas meu pai sempre me mantinha debaixo de um olhar sereno, ás vezes nervoso e preocupado, mas calmo, como quem sabe o que fazer caso tudo na minha vida desse errado. Não deu errado. Nem sei, diante dos antigos parâmetros, o que deu certo. Mas cá estou. E depois de escolhas tão diferentes, destino e coração tão distintos daquela casa, me pergunto hoje o porque desse vazio. Hoje foi um dia ruim, mas daqueles que a gente aprende, de um jeito ou de outro. Percebi que ainda me faltam coisas, palavras, gestos, e que não há mais tempo pra recuperar. Esgotou a vontade de buscar, de esperar, de repensar e perdoar a fim de que aquele olhar se volte apenas com intenção de cuidado, proteção e desejo de felicidade. Me sinto ao mesmo tempo, culpada, fraca, sem aquele velho jogo do contente, quando me mostrava a parte boa, ou não tão ruim de não escutar as coisas que sempre quis. Sinto falta de ouvir que as coisas na minha vida vão sim dar certo, mesmo que ás vezes pareça que não. Me falta a voz que acalme, que não me culpe sem motivos, que não me compare a qualquer pessoa. Sinto falta de poder contar as felicidades de amar outra pessoa, sem medo ou receio, esperando que eu receba com fraternidade um desejo que eu seja ainda mais amada, que meu futuro seja lindo ao lado dela, que eu tenha a filha, ou o filho que tanto sonho e que ele seja um neto querido. Queria o interesse por minha vida, de forma calma, curiosa e amorosa, de forma que soubesse quando choro, os motivos, as vontades, meus refúgios e pontos fracos. Pois por tantos anos, mesmo não entendendo os motivos e razões daquele mundo adulto, e por ser tão nova, o meu quarto estava sempre aberto, eu poderia ficar a noite toda acordada vendo programas que não entendia esperando meu pai chegar da faculdade, escutando coisas sobre casais, buscando e cuidando dos meus irmãos mais novos, e, sem questionar muito, assistindo cenas difíceis de lembrar. Não entendo, mas nada nem ninguém, substitui essa grande falta.
Eu falo como se fosse a primeira vez. Sinto medo como se tivesse ainda quinze anos. E já que falar tudo que eu queria não tá adiantando muito, não vai mudar... eu peço que faça qualquer coisa, pra eu não ver mais beleza em qualquer lugar ou coisa que tenha você. Grata.
Comentários